A troca de bolas sobre a relva arregalava qualquer olho. Havia aquele fulgor que parece apenas pertencer aos jovens. Carlos Alcaraz tentou o lob. Alex de Minaur resolveu o problema. O espanhol voltou à carga e, num vólei amortizado, o australiano conquistou o ponto. A bola, encantada, até regressou para o seu lado do court. Atrasado e sem perder o cavalheirismo que o vai definindo, Alcaraz esticou a mão para o adversário como quem lhe tira o chapéu.
Depois da vitória exuberante nas meias-finais de Queen’s contra Sebastian Korda, Carlitos avisou que estava a jogar bem, o que o surpreendia até. É que era somente o seu terceiro torneio na relva e parecia que ali jogava há 10 anos. E foi isso mesmo que se viu este domingo diante de Alex de Minaur, que foi capaz de suster durante muitíssimas bolas o poderoso martelo que vive no braço direito do tenista espanhol. A vitória parecia inevitável e assim foi: 6-4, 6-4 e regresso ao posto de número 1 do ranking ATP.
É assombrosa a forma como o murciano se adaptou à relva. A velocidade, o toque de bola e as respostas, a forma como deixa o rival sempre em estado de alerta, sempre com a noção de que se fraquejar cairá sem piedade alheia.
Alex de Minaur, residente em Alicante, foi exemplar nas trocas de bolas. Rapidíssimo a defender, estendia-se por todo o court com uma atitude estóica. De vez em quando, aproveitou as pedradas do adversário para lhe causar problemas. Quando fraquejou, o serviço surgiu ao resgate de Carlos Alcaraz, o homem que com este encontro soma já 40 vitórias em 2023 e conquistou o 11.º torneio ATP da carreira com apenas 20 anos.
No primeiro set, o espanhol salvou dois breaks, com o serviço a ser decisivo. Depois, quebrou o jogo de serviço do australiano e serviu para fechar o primeiro set: 6-4 em 49 minutos.
Entre os sets recebeu assistência médica. O fisioterapeuta ligou-lhe uma das coxas. O desempenho do tenista não parecia sair afetado por tal limitação. Uma dupla falta de De Minaur colocou Alcaraz na frente com 3-2 no segundo set, uma autoestrada rumo a mais um dia feliz para o próximo número 1 do mundo a partir de segunda-feira.
Apesar da boa réplica de Alex de Minaur no court principal daquele torneio em Londres, este nunca esteve perto de ameaçar o que Daniil Medvedev e Jannik Sinner fizeram em Wimbledon, em 2021 e 2022, nas tais duas únicas aparições do fenómeno espanhol na relva.
O 5-3 chegou com naturalidade e foi aqui, numa altura em que servia para fechar o encontro, que os nervos se apoderaram de Carlitos. Somou alguns erros e De Minaur chegou ao 0-30. Mas a pancada no serviço de Alcaraz voltou a corrigir a rota da angústia para a felicidade. Na derradeira jogada, o australiano atirou a bola para fora do court e o espanhol festejou o primeiro título na relva.
Na entrevista rápida, Carlos Alcaraz admitiu que era “fantástico” sentir-se tão bem na relva, assim como é sempre “especial” ganhar qualquer torneio. Sobre chegar como número 1 a Wimbledon, um dos quatro grandes torneios do Grand Slam, o espanhol disse que era indiferente para o torneio em si, mas que lhe injetava confiança e motivação.
Afinal, por lá estará sempre o poderoso e sábio Novak Djokovic, a maior ameaça à sua estante de medalhas e troféus, que o eliminou na semifinal de Roland-Garros, no dia em que o corpo falhou a Carlitos e assim nos foi sonegado um dos grandes jogos para a memória futura.
Com a vitória em Queen’s, um torneio ATP 500, Alcaraz somou o quinto título da temporada, o que lhe permite igualar o registo de 2022. Ou seja, o tenista convive com duas sombras, a sua e a dos arquivos de história.