Nesta noite chuvosa de março, Rúben Amorim preparou o que quer que seja maio. O treinador do Sporting sabe que, nesta fase, para ser campeão importa ganhar jogos, todos, e para ganhar jogos, mais do que ser bonito ou feio, é preciso ler o adversário.
E Amorim fê-lo na perfeição. Em casa do Arouca, uma das melhores equipas do campeonato, num relvado pesado e progressivamente mais impraticável, o Sporting anulou os pontos fortes da equipa de Daniel Sousa, travando o entendimento telepático de Jason, Mujica e Cristo, as transições que tantos golos lhes têm valido, oferecendo a bola, humildemente oferecendo a bola ao adversário, digamos até, assumindo as suas próprias fragilidades. No final, o 3-0 para o Sporting é o espelho talvez demasiado aumentado de um encontro taticamente irrepreensível dos leões, que marcaram cedo, dando-lhes a oportunidade de decidirem o que queriam do jogo. Sofreram, é certo, mas quase sempre no controlo, engordando a vantagem já nos descontos.
O golo de Gyokeres aos 19’, não demasiado cedo ou tarde demais, permitiu a Amorim sacar da melhor das estratégias que teria, seguramente, preparadas para uma deslocação que seria uma das mais exigentes até maio. O Sporting entrou com bola, fazendo várias aproximações, com Gyokeres importante na dimensão física e Trincão a trazer a técnica possível num relvado em muito mau estado. Foi o jovem português que liderou o lance do golo, com a ajuda de Trincão a arrastar defesas, que protegiam a zona central, encontrando depois Matheus Reis que na esquerda cruzou para o sueco encostar para a baliza. As oportunidades não seriam muitas e o Sporting soube aproveitar a mais bem trabalhada pelo seu ataque.
Na frente, os leões baixaram linhas, protegeram a profundidade, que o Arouca tanto gosta de aproveitar. Em organização atacante, a equipa de Daniel Sousa é mais frágil, mas ainda assim criou perigo. Sylla foi um quebra-cabeças para Eduardo Quaresma, defesa tecnicista e que gosta de ter bola, algo impossível em Arouca. O Sporting ia tentando dar de beber ao adversário o seu próprio veneno, lançando Gyokeres para grandes cavalgadas. O sueco, no entanto, não esteve fino na decisão ao longo de todo o jogo, embora tenha sido sempre essencial a trazer a fisicalidade necessária para ganhar duelos e bolas.
Franco Israel esteve atento nos momentos mais efetivos do Arouca, salvando aos 34’ um remate de Sylla, e evitando a mais que possível recarga: Mujica e Jason estavam preparados para a fazer. Diomande ia limpando o resto, com uma calma demolidora, ganhando duelos, sempre colocado no sítio certo - foi o melhor jogo do costamarfinense desde o regresso da CAN.
A iniciativa oferecida pelo Sporting podia ser um presente envenenado mas o Arouca escolheu ser corajoso. Mas a coragem necessita também de fulgor físico, que foi-se perdendo na 2.ª parte. Com espaço para as transições, o Sporting teve dificuldade em o transformar em oportunidades. Arruabarrena, tal como já tinha feito na 1.ª parte, ia ganhando nos frente a frente com Gyokeres, com o sueco a dar-se ao jogo em muitas outras dimensões, importante a moer a cabeça e o espírito à defesa do Arouca, roubando-lhes a frescura física e evitando que a bola estivesse jogável para a equipa da casa.
Mexendo na equipa, Rúben colocou em campo a presença física de Paulinho, mais pesado que Trincão, com mais capacidade para reter bolas. É foi dos pés do avançado português que saiu o lançar de Geny, que já para lá dos 90’ e com o Arouca de rastos, passou por dois rivais e rematou a contar de pé esquerdo. Minutos depois, Hjulmand, sempre sereno, sempre forte, simples, decisivo para este Sporting, ganhou um lance a David Simão, Gyokeres fez o mesmo mais à frente, a tempo de devolver a bola ao colega nórdico, que fez o 3-0, números gordos numa noite em que o Sporting só queria ganhar, navegando com maio à vista.