Chamem os anciãos da linguagem, está para ser inventada uma palavra que se use quando se trata do pior dos segredos mal guardados, tão mal ocultado que dispensa a previsão, toda a gente sabe, simplesmente, o que vem aí e, mesmo assim, ninguém está capacitado para impedir que aconteça.
Há termos ou expressões que roçam esse propósito, beliscam-no, mas não se trata bem de uma inevitabilidade, nem de uma tragédia anunciada, tão pouco encaixa na história do golpe inadiável e por isso é uma carambola das tarefas achar uma palavra que sirva ao significava ver Arjen Robben encostado à direita de um campo de futebol, com a bola no pé.
O holandês cravou no futebol uma descarada incapacidade em guardar segredos. Nele, nos adversários que o encararam e em quem os via a jogar, sempre se notou a léguas que este futebolista ia tentar arranjar forma de driblar corpos em direção ao centro do campo, até se abeirar da área e simular, ameaçar e enganar e fazer crer uma última vez antes de rematar a bola em arco, com um efeito de aba para a fazer entrar perto do poste direito da baliza.
Era constante ver Robben a fazer um Robben e o holandês fez a carreira assim, notabilizando-se a fazê-lo no Chelsea, no Real Madrid e sobretudo no Bayern de Munique, onde contou 10 anos a ser dos melhores futebolistas capazes de, sozinhos, desequilibrar um jogo se a bola lhes chegasse aos pés.
Mas, no verão de 2019, os estilhaços de tantos cristais partidos acumularam-se-lhe no corpo e o holandês, então com 35 anos, cedeu às mazelas que ciclicamente o paravam e retirou-se do futebol. As lesões são coisas que arranjam forma de ser maiores do que o talento.
Mesmo condenado a ser traído pelo próprio corpo, Robben aguentaria quieto apenas um ano. No verão seguinte, com pompa se anunciou que estava de regresso à companhia da bola no Groningen, clube no qual começara a carreira. Virava mais um futebolista a recusar ceder ao tempo.
E o tempo e a bagagem particular que tem com o holandês relembrou-o disso mesmo logo ao primeiro jogo, Arjen Robben sairia lesionado, a pedir para ser substituído, agastado com uma cara de quem não foi permitido zarpar numa diagonal de fora para dentro.
A época de 2020/21 acabaria por lhe dar apenas sete jogos feitos pelo Groningen, o último a contar para o play-off que lhe garantiria provas europeias nesta temporada. Mas o corpo, as lesões, os músculos que o puxam à realidade, fizeram-no chegar "a uma conclusão honesta" e pensar como "a cabeça e o coração estavam a puxar em direções opostas".
Agora, com 37 anos, o mais previsível dos holandeses sendo o mais imparável vai deixar de executar o seu truque. "O coração queria continuar, mas a decisão de parar é justa e realista", lamentou, esta quinta-feira, o senhor vai-para-dentro-e-chuta que ainda recordou como tinha "embarcado nesta aventura com grande energia e entusiasmo".
O tempo e as lesões de que Arjen Robben fugia acabariam por apanhá-lo. O holandês fez por as fintar o máximo que pôde, da maneira que mais gostava, da única forma que qualquer adepto de futebol esperaria dele.