Ténis

E Sinner, como tantos, sucumbiu à grandeza de Djokovic em Wimbledon

O tenista sérvio venceu Jannik Sinner com os parciais 6-3, 6-4, 7-6 e, não só somou a 34.ª vitória consecutiva no torneio londrino, como alcançou as 35 finais de majors, um recorde. O homem que vai cancelando o triunfo da nova geração diz que se sente jovem. “Os 36 são os novos 26.”
Patrick Smith

Há um miúdo na Roménia que nada como os deuses. Veloz como um predador e gracioso como uma borboleta, David Popovici é o fenómeno na piscina que, aos 18 anos, encontrou o caminho para a felicidade inconvencional a ler Epicuro, Séneca e Marco Aurelio. É uma bala, porém uma bala com consciência. A certa altura na conversa com o “El País”, o romeno esboçou com palavras algo fundamental no desporto de alta competição.

“Para que algo pareça muito simples tens que dominar cuidadosamente o mais complicado. (...) Faz falta mais técnica para se ser excelente no que é simples. Porque realmente nada é simples”, disse Popovici, numa das muitas reflexões valiosas. Novak Djokovic, apostado em tornar-se no maior tenista de todos os tempos, podia ter dito uma coisa semelhante por estes dias em Wimbledon ou nas últimas duas décadas, na verdade.

É uma pantera com pantufas que encolhe o seu campo e estica o do rival. Simplifica, lá está, o que parece uma atrocidade enigmática. Abre ângulos como poucos, chega quase sempre onde tem de chegar, toca na bola com a sabedoria de um samurai ou com a secura de um martelo quase embrutecido. Jannik Sinner, um concorrente que visava alcançar a segunda final em Wimbledon para um italiano (Matteo Berrettini 2021), sentiu tudo isso na pele. E o tal favoritismo que Djoko assumiu na véspera, rindo-se serenamente como um campeão, transformou-se num dogma logo nos primeiros dois jogos de serviço. Sinner teve hipóteses de quebrar o jogo de Novak e falhou. A seguir, numa situação invertida, Djokovic não vacilou e assim se começou a escrever esta história.

O primeiro set, apesar de algumas boas réplicas e belíssimas pancadas do tenista italiano, foi um exercício de manipulação. Novak Djokovic (n.º 2 do ATP) metia Sinner (8.º) onde queria, usava a raquete como se fosse uma guitarra. Dava-lhe música. E o rival, aqui e ali com problemas com o slice alheio, dançava como um limpa pára-brisas. E ia caindo nos truques do profissional das armadilhas. O ténis foi falando, o marcador acatou o que lhe diziam e exibiu um pouco surpreendente 6-3 para o sérvio.

Julian Finney

A seguir, logo no segundo jogo de serviço de Sinner, Djokovic voltou a marcar a diferença conseguindo um break. As madeiradas do italiano sugeriam alguma impotência ou atrasos. Para Toni Nadal, tio e antigo treinador de Rafa, Sinner era “o jogador mais perigoso” que os favoritos a ganhar o torneio, Djokovic e Carlos Alcaraz, podiam enfrentar. “Tem provavelmente a velocidade de cruzeiro mais alta do circuito”, escreveu o espanhol, o que transforma em algo grandioso o que testemunhámos Novak Djokovic fazer esta tarde, em Londres. “[Tem] muitos bons golpes, tanto de direita como de esquerda, e um serviço potente”, referiu ainda, alertando que a falta de variabilidade no jogo do italiano poder ser um problema.

E sentenciou uma versão que se revelaria também esta tarde: uma “fiabilidade baixa nos momentos chave”. As bolas que almejavam beijar as linhas preferiam os beijos de Novak, que às vezes parece nem forçar muito, preferindo aguentar a bola jogável até que os outros se precipitem ou falhem dolorosamente. O sérvio oferece pouco aos outros. É um leão da competitividade. Mentalidade de aço. Por isso, aquele tal break foi o suficiente para fechar o segundo set com um 6-4.

O nível de Sinner melhorou substancialmente no terceiro set. Viram-se bolas mais longas, algumas coragens renovadas. Finalmente, Djokovic revelou alguns problemas. Na entrevista pós-partida, depois da 34.ª vitória consecutiva em Wimbledon, o sérvio admitiu isso mesmo, que Sinner o pressionou bastante e que só alguns erros do italiano lhe permitiram ir para tiebreak, onde acabaria por fechar o encontro.

Antes, com dois match points para o italiano, alguém berrou da bancada e isso incomodou Djokovic, que parou, aplaudiu ironicamente, talvez deixando mais desconfortável o adversário. Sinner pecou e voltou a pecar. E Novak, com um 7-4 no tiebreak, confirmou a nona presença na final do torneio londrino, onde ganhou em 2011, 2014, 2015, 2018, 2019, 2021 e 2022. Demonstrou mais uma vez a fortaleza mental em que se refugia, salvando todos os pontos de break que Sinner teve contra ele (6).

“O marcador não mostra a realidade do que aconteceu no court, foi muito renhido”, explicou no final o número 2 do mundo. “[O Jannik] provou que é um dos líderes da próxima geração e um dos melhores jogadores do mundo, sem dúvida”, afirmou, antes de a seguir assumir o gosto por ainda fazer parte desta nova geração, arrancando risos aos espectadores. Afinal, a idade não conta, garante. “Sinto que os 36 anos são os novos 26, sabe bem”, confessou. A data no passaporte não tem nada a dizer contra as certeiras pancadas na bola amarela. “Sinto muita motivação e muita inspiração para jogar o ténis que adoro. Tento ser honesto, retribuíndo o favor a este desporto, jogando o máximo que possa.”

Na final, que lhe pode garantir o triunfo no 24.º torneio do Grand Slam, o tenista sérvio terá pela frente Carlos Alcaraz ou Daniil Medvedev, um jogo que vai observar deitadinho na mesa de massagens. São já 35 finais de majors para o sérvio, um recorde. Citando o filósofo Popovici, nada é simples. Mesmo que, depois de tanto, pareça.