Tribuna 12:45

Tadej Pogačar, o herói do impossível que não teme ser Ícaro

Pogačar, cruzando triunfalmente a meta na Piazza del Campo, em Siena
Dario Belingheri

A imagem podia ser um quadro renascentista. Um fresco. Uma obra pendurada numa casa senhorial da Toscânia, apreciada entre copo de vinho e prato de queijo. Um homem, a multidão, o triunfo. A glória, o sofrimento, o corpo rasgado, sinal do tributo físico que foi preciso pagar aos deuses para chegar àquele paraíso.

Mas não é uma pintura. Nem é uma mera lenda, por muito que seja lendário. É Tadej Pogačar, o impossível em duas rodas. Ou o impossível sem estar em cima de duas rodas, como aconteceu na Strade Bianche.

Na prova que decorre entre o pó das vinhas nos arredores de Siena, o esloveno caiu, com estrondo e aparato, a menos de 50 quilómetros da meta da Pizza del Campo. O incidente foi feio, deixou visíveis marcas, fez lembrar a maldita queda na Liège-Bastogne-Liège em 2023, um percalço que afetaria decisivamente o seu rendimento no Tour desse ano, com constantes dores no escafoide.

Mas Tadej citou José Mourinho. Em condições normais, ganha. Em condições anormais, ganha. Sem quedas, vence. Com quedas, vence.

“Copiar e colar é aborrecido. Se fizesse o mesmo todos os anos, perderia motivação, preciso sempre de novos desafios”, diz o campeão do mundo. Como qualquer génio, Pogi precisa de fugir ao tédio, de inventar e se reinventar. Tal como viu a ascensão de Jonas Vingegaard, capaz de o derrotar no Tour em 2022 e 2023, como a chegada de um adversário à sua altura — que derrotaria no Tour em 2024 —, Tadej olhou para a queda na Strade como mais um bocado de impossível que estava ali para virar possível.

Na tela de cores de Pogačar, o quadro renascentista de Siena foi mais uma obra para quem já compõe uma galeria. Vencer o Mundial atacando a 100 quilómetros do fim? Claro. Fazer a dobradinha Giro-Tour, com seis vitórias de etapa em cada? Pois sim.

Com o corpo cheio de mazelas, Pogačar, de arco-íris, venceu a Strade Bianche
Tim de Waele

Conta-se que é nos estágios em altitude, quando treina entre o silêncio das montanhas na Serra Nevada ou nos Alpes, que Pogi partilha os seus planos com os que lhe são mais próximos. Uma das confidentes é, claro, Urška Žigart, sua namorada e também ciclista de elite, atual campeã eslovena em linha e contra-relógio. Outro dos habituais companheiros desses treinos, dessas pedaladas pelo meio de alguns dos topos mais exigentes da Europa, é o polaco Rafał Majka, fiel escudeiro.

Talvez Zigart ou Majka saibam a resposta para uma das perguntas mais repetidas da atualidade do ciclismo: vai Pogačar participar no Paris-Roubaix?

A 13 de abril, a grande clássica do pavê terá a sua 122.ª edição. Será, como sempre, um percurso de sofrimento, de caminhos empedrados, de risco de quedas e outros azares, 260 quilómetros de dor. É território de corredores encorpados, musculados, que aguentam andar a rolar em cima do piso irregular. Peso dos últimos vencedores em Roubaix: 75 quilos (Van der Poel), 78 quilos (Van Baarle), 74 quilos (Colbrelli), 75 quilos (Gilbert), 78 quilos (Sagan), 74 quilos (Van Avermaet), 78 quilos (Hayman), 82 quilos (Degenkolb). Peso de Pogačar? 66 quilos.

Tadej não esconde que, num dado momento da sua carreira, tentará ganhar o “inferno do norte”, que procurará ir àquele mundo de ciclistas com mais 10 ou 15 quilos que ele e vencer. Há décadas que um campeão de grandes voltas não celebra em Roubaix. Será em 2025?

Talvez Zigart ou Majka tenham a resposta. O que se sabe é que, na Strade, Pogi completou um ano irreal. Em 2024, arrancou a temporada ganhando, exatamente, em Siena. Os resultados nesta volta ao sol? Terceiro na Milão-San Remo, vitória na Volta à Catalunha (ganhando quatro etapas), vitória na Liège, vitória no Giro (ganhando seis etapas), vitória no Tour (ganhando seis etapas), sétimo no GP Québec, vitória no GP Montréal, vitória no Mundial, vitória no Giro dell'Emilia, vitória na Lombardia, vitória no UAE Tour (ganhando uma etapa), vitória na Strade Bianche.

Aos 26 anos, o esloveno, que conseguiu treinar o seu sistema digestivo para ser capaz de ingerir e processar 120 gramas de hidratos de carbono por hora enquanto corre — essa e outras confissões nesta excelente entrevista a Peter Attia —, tem já 92 vitórias na carreira. Soma a isso uma forma de perder à campeão, lutando até final, felicitando e reconhecendo quem o supera, como se viu nos cumprimentos a Jonas em 2022 ou 2023.

Um homem que valoriza o ciclismo pedalado por mulheres. No fim da Strade Bianche, disseram-lhe que jamais um campeão do mundo triunfara naquela corrida. “Mas, se não me lembro mal, a Lotte [Kopecky, corredora belga] fê-lo o ano passado”, retorquiu Tadej.

Pogi não parece assustar-se com tanto desbravar de novos caminhos para o ciclismo. Ele é o melhor embaixador da modalidade, um espetáculo constante durante a temporada, uma homenagem permanente às bicicletas, ciclismo de ataque, ousado, que arrasta multidões. Ele valoriza a história da modalidade, valoriza os homens que o derrotam, as mulheres que fazem feitos antes que ele os obtenha. A existência de Tadej é uma benção para o ciclismo.

Pogačar não teme ser Ícaro. Não tem medo de voar perto do sol, de se queimar, de que se derretem as asas, de cair ao Mar Egeu. A ambição não tem limites, mas é uma ambição sorridente, leve, manifesta enquanto pedala com tufos de cabelo saindo pelo capacete. Segue-se a Milão-São Remo, a 22 de março, um dos dois monumentos que ainda não conquistou. O outro? O Paris-Roubaix.

O que se passou

Zona mista

Há a libertação de: 'fogo, finalmente'. Eu sabia que isto está a chegar.

A honestidade de Salomé Afonso, partilhada instantes depois de se sagrar vice-campeã europeia dos 1500 metros. A atleta de 27 anos brilhou em Apeldoorn, onde também conquistou o bronze nos 3000 metros. Isaac Nader foi bronze nos 1500, tal como Auriol Dongmo no lançamento do peso.

O que vem aí

Segunda-feira, 10

⚽ I Liga: Famalicão-Rio Ave (20h15, Sport TV1)
⚽ No futebol internacional, há West Ham-Newcastle (20h00, DAZN1), Lazio-Udinese (19h45, Sport TV3) ou Espanyol-Girona (20h00, DAZN2)
🎾 O torneio de Indian Wells, para alguns o quinto major, entra na semana decisiva (18h00, Sport TV2)
🚴‍♂️ No ciclismo, a semana é marcada por duas das mais importantes corridas por etapas da primeira metade da temporada. Em Itália, o Tirreno-Adriático (12h05, Eurosport 2), com Afonso Eulálio, Rui Costa e Rui Oliveira, e ,em França, o Paris-Nice (14h45, Eurosport 2), com João Almeida, Ivo Oliveira e Iuri Leitão

Terça-feira, 11

⚽ Dia de jogo grande para o Benfica, com a deslocação a Barcelona para a segunda mão dos oitavos de final da Liga dos Campeões (17h45, Sport TV5)
⚽ Também na Liga dos Campeões, Inter-Feyenoord (20h00, DAZN3), Liverpool-PSG (20h00, DAZN1) e Bayer Leverkusen-Bayern Munique (20h00, DAZN2)
🏀 Na NBA, Brooklyn Nets-LA Lakers (00h40, Sport TV1) e Memphis Grizzlies-Phoenix Suns (00h00, Sport TV3)
🎾 Indian Wells, a partir das 18h00 (Sport TV2)
🚴‍♂️ Etapa 3 do Paris-Nice, com um contra-relógio coletivo (14h45, Eurosport 2)
🏐 Quartos de final da Champions de voleibol: Monza-Perugia (19h30, Sport TV4)

Quarta-feira, 12

⚽ Ficaremos a conhecer as restantes quatro equipas que avançam para os quartos de final da Liga dos Campeões: Lille-Dortmund (17h45, DAZN1), Arsenal-PSV (20h00, DAZN1), Aston Villa-Club Brugge (20h00, DAZN2) e Atlético de Madrid-Real Madrid (20h00, Sport TV5)
🏀 Os Celtics de Neemias Queta contra os Oklahoma City Thunder (23h30, Sport TV3)
🎾 Indian Wells (18h00, Sport TV2)
🚴‍♂️ Etapa 3 do Tirreno-Adriático (12h05, Eurosport 2) e etapa 4 do Paris-Nice (14h45, Eurosport2)
⛷️ Esqui freestyle, Taça do Mundo, Livigno (11h20, Eurosport1)

Quinta-feira, 13

⚽ Pode ser um dia histórico para o Vitória SC, que depois de empatar a dois em Sevilha recebe o Betis na segunda mão dos oitavos de final da Liga Conferência (20h00, Sport TV5)
⚽ Na Liga Europa, o United de Ruben Amorim tem um embate muito importante diante da Real Sociedad (20h00, DAZN1). Ainda Athletic-Roma (17h45, DAZN1) ou o Rangers contra o Fenerbahçe de Mourinho (20h00, DAZN2)
🎾 Na DAZN6, siga o torneio feminino de Indian Wells (18h00). O masculino prossegue na Sport TV2 (18h00)
⚽ A seleção feminina de futsal joga contra a Espanha (19h00, Canal 11)
🚴‍♂️ Etapa 4 do Tirreno-Adriático (12h05, Eurosport2) e etapa 5 do Paris-Nice (14h45, Eurosport2)
⛷️🔫 Biatlo, Taça do Mundo, Pokljuka (14h00, Eurosport1)

Sexta-feira, 14

⚽ A II Liga está ao rubro e terá dose dupla: Portimonense-Feirense (18h45, Sport TV+) e Alverca-Torreense (20h45, Sport TV1)
🏀 Os Celtics de Neemias contra os Miami Heat (23h00, Sport TV1)
⚽ Na Arábia Saudita, Al-Nassr-Al-Kholood (19h00, Sport TV2)
🚴‍♂️ Mais Tirreno-Adriático (12h05, Eurosport 2) e Paris-Nice (14h45, Eurosport 2)
🎾 Indian Wells, já na fase decisiva (00h00, Sport TV2)

Sábado, 15

⚽ Dia cheio de I Liga, com as lutas pelo título, Europa ou manutenção em jogo: Farense-SC Braga (15h30, Sport TV1), Gil Vicente-Santa Clara (15h30, Sport TV2), FC Porto-AVS (18h00, Sport TV2) e Sporting-Famalicão (20h30, Sport TV1)
⚽ Lá fora, destaque para o City-Brighton (15h00, DAZN1), para o AC Milan de Conceição contra o Como de Fàbregas (17h00, Sport TV3), para o Villarreal-Real Madrid (17h30, DAZN1) ou para o RB Leipzig-Dortmund (17h30, DAZN3)
🏍️ Moto GP, corrida sprint do GP Argentina (18h00, Sport TV4)
🎾 Indian Wells, meias-finais masculinas (20h30, Sport TV2)
🚴‍♂️ Penúltimas etapas do Paris-Nice (12h25, Eurosport 2) e do Tirreno-Adriático (14h15, Eurosport 2)
🏉 6 Nações: Itália-Irlanda (14h05, Sport TV7) e Gales-Inglaterra (16h35, Sport TV7)

Domingo, 16

⚽ Mais um dia cheio de I Liga: Arouca-Estoril (15h30, Sport TV1), Nacional-Casa Pia (15h30, Sport TV3), Rio Ave-Benfica (18h00, Sport TV1), Moreirense-Boavista (20h30, Sport TV3) e Vitória-Estrela (20h30, Sport TV2)
⚽ Há dérbi em Londres, com um Arsenal-Chelsea (13h30, DAZN1). Ruben Amorim visita Leicester (19h00, DAZN1), há clássico na Ligue 1 entre PSG e Marselha (19h45, Sport TV4) e duelo na luta pelo título na Serie A, com um Atalanta-Inter (19h45, Sport TV7)
⚽ Final da Taça da Liga em Inglaterra: Liverpool-Newcastle (16h30, Sport TV2)
🏍️ Moto GP, GP Argentina (18h00, Sport TV4)
🏉 A disputa pelo terceiro lugar no Rugby Europe Championship entre Portugal e Roménia (15h00, Sport TV5)

Hoje deu-nos para isto

Ponto prévio: quantas vezes, no passado recente, o FC Porto apresentou um onze com um nível individual tão baixo como em Braga?

Sabemos como é difícil o contexto dos dragões. Conhecemos as revoluções recentes, a perda de talento do plantel. Se já era assim no começo da época, imagine-se com as saídas de Galeno e Nico. Se já era assim no começo da época e se acentou sem Galeno e Nico, imagine-se sem Pepê, sem Fábio Vieira, sem Rodrigo Mora.

É preciso ter isto em mente para falar do FC Porto que atuou em Braga. Um conjunto carente de talento, com João Mário e Gonçalo Borges como armas de desequilíbrio. Ou de tentativa de desequilíbrio. Ou de tentativa de qualquer coisa que seja o que Gonçalo Borges faz quando pega na bola, mete a cabeça para baixo e avança até o lance se perder.

Martín Anselmi chegou a Portugal cheio de promessas, bem-falante, confiante. Um mês e meio depois, parece um homem que perdeu rapidamente a fé, com pouca esperança no olhar. Prometeram-nos futebol atacante e eis o FC Porto em Braga com três centrais, três laterais, dois médios não especialmente criativos. E Gonçalo Borges.

Diogo Cardoso

Martín Anselmi chegou a Portugal com vontade de falar de futebol. Passadas seis semanas, é um homem bem mais amargo, que responde com um olhar condescendente, como se estivesse a vender uma fórmula que os demais não têm capacidade cognitiva para entender.

Diz que não liga a estatísticas, dizendo-o quando é confrontado com elas pelos jornalistas (exemplo de estatística a que Martín poderá não ligar: o FC Porto só fez 14 remates à baliza do adversário nos últimos sete jogos), mas socorre-se delas para provar que a sua equipa domina; diz que gosta de falar de futebol, mas, de forma algo surreal, reclama um penálti dizendo que um lance parecido num Farense-AVS da ronda anterior teve direito a castigo máximo.

Talvez, na revolução Martín Anselmi, seja preciso ficar pior antes de melhorar. Talvez haja aqui uma destruição criativa, um processo oculto que, de facto, nos escapa. O que não nos escapa? Nove jogos de Martín Anselmi, três vitórias do FC Porto, quatro empates, duas derrotas. Anselmi chegou a Portugal com os azuis e brancos com os mesmos pontos que o Benfica e com quatro de vantagem para o SC Braga. Passadas seis jornadas, o FC Porto está a seis pontos do Benfica e com os mesmos do SC Braga. Perdón pelas estatísticas, Martín.

Daqui até final da temporada, o ex-Cruz Azul lutará pela possibilidade de começar 2025/26. Para conseguir ganhar dois jogos seguidos, algo que a equipa ainda não conseguiu em 2025, é preciso aumentar a qualidade individual. É necessário ter Pepê, Vieira, Mora. E, quando os tem, é bom não os trocar de uma vez, como diante do Vitória SC.

Anselmi não tem culpa que este seja o FC Porto mais diminuído em qualidade em muito tempo. Não tem culpa de ter chegado com a época em andamento, numa fase particularmente cheia do calendário. Mas, por muito que se planeie uma revolução, é bom ver alguma evolução, sob pena de não ter tempo para chegar à fase em que, depois de ficar pior, ficará melhor.

Tenho uma excelente semana, cuidado com as chuvas e obrigado por nos acompanharem, lendo-nos no site da Tribuna Expresso, onde poderá seguir a atualidade desportiva e as nossas entrevistas, perfis e análises. Se quiser, siga-nos no Facebook, Instagram e no X -e também já na Bluesky, se por lá andar. Para nos ouvir, pode escutar o “No Princípio Era a Bola”, o nosso podcast semanal com o Tomás da Cunha e o Rui Malheiro a analisar o planeta futebol.