Futebol internacional

Vitória para a Superliga: Tribunal de Justiça da União Europeia determina que UEFA e FIFA não podem travar a criação de novas competições

Numa sentença que pode mudar o futebol internacional, o TJUE considerou que o monopólio da FIFA e da UEFA é “contrário ao direito da União Europeia”, havendo um “abuso de posição dominante” por parte de ambas as entidades, que “não podem proibir clubes e jogadores de participarem noutros torneios”. A organização da Superliga já se congratulou, dizendo que o futebol é “livre”

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Era a sentença mais aguardada dos últimos meses do futebol europeu. Mais de dois anos e meio depois do começo do caso Superliga, o Tribunal de Justiça da União Europeia pronunciou-se sobre o caso. E a decisão foi favorável à criação de novas competições: segundo o TJUE, a UEFA e a FIFA não podem travar o surgimento de novos torneios, sendo o monopólio de ambas as entidades contrário à legislação comunitária.

No Luxemburgo, o veredicto ditado por 15 juízes determinou que há uma atual situação de monopólio, por parte da UEFA e da FIFA, que é “contrária ao direito da União Europeia”. As entidades máximas do futebol europeu e mundial têm, de acordo com o tribunal, atuado em “abuso de posição dominante”, não podendo, legalmente, "proibir clubes e jogadores de participarem noutros torneios”.

Ao contrário do que defendiam a UEFA e a FIFA, a organização de competições de futebol é, entende o TJUE, uma atividade económica ao abrigo do direito comunitário, pelo que "tem de cumprir com as regras da concorrência e respeitar a liberdade de circulação”, estipula a sentença. Desta forma, a atuação da UEFA na primavera de 2021, quando bloqueou a criação da Superliga, é contrária ao direito da União Europeia.

Não obstante, o TJUE sinaliza que esta sentença não significa que um projeto como a Superliga deva, necessariamente, ser aprovado — até porque ainda não há um formato em concreto. O Tribunal especifica que avaliou as competências e atuação da FIFA e da UEFA, mas não a legalidade da Superliga em concreto.

A22 Sports Management, a empresa por detrás da organização da Superliga, já celebra a vitória. Num comunicado, o CEO da A22, Bernd Reichart, diz que se ganhou “o direito a competir”, sendo, agora, o futebol “livre”. “Os clubes estão livres da ameaça de sanções e livre para determinar o seu próprio futuro”, argumenta o alemão.

Em declarações à Tribuna Expresso, nos últimos dias, Reichart já defendera a posição da Superliga, acusando a UEFA de “abusar do enorme poder que tem”.

O responsável da Superliga já avançou com as primeiras medidas para a competição, cujo formato é incerto: jogos de transmissão grátis, sem estarem em plataformas ou canais pagos, e pagamentos de solidariedade para os clubes, redistribuindo as receitas.

A ideia de uma Superliga, estabelecida à parte da UEFA e não debaixo do chapéu da organização de Nyon, era há muito debatida nos corredores de poder do futebol europeu. Durante vários anos, sempre que se discutiam reformas na Liga dos Campeões, os maiores clubes jogavam, junto da UEFA, a carta da criação de um torneio independente para pressionarem a organização, fazendo com que as mexidas na Champions fosse do seu agrado. Assim, ao longo do tempo, os principais campeonatos foram ganhando, cada vez, mais vagas diretas, por exemplo

Em abril de 2021, a bomba foi, inesperadamente, lançada. Houve 12 clubes (Real Madrid, Barcelona, Atlético de Madrid, Juventus, Inter, AC Milan, Manchester United, City, Liverpool, Arsenal, Chelsea e Tottenham) que anunciaram a criação da Superliga, à revelia da UEFA, num torneio em que essa dúzia de equipas tinha presença permanente.

O projeto teve forte oposição por parte da UEFA, mas também de adeptos ou até de dirigentes políticos. Três dias depois da divulgação do projeto, a contestação geral levou a que nove dos fundadores já tivesse comunicado a sua saída da Superliga, mantendo-se somente Real, Barça e Juve.

No entanto, a organização da competição separatista deu entrada, num tribunal de Madrid, de um processo que questionava a legitimidade da UEFA e da FIFA, colocando em causa o monopólio dessas entidades, à luz do direito comunitário. O tribunal espanhol levou a questão ao TJUE, que agora decidiu.

Bernd Reichart, o CEO da Superliga
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No último ano e meio, foi havendo trocas de argumentos e acusações entre os maiores defensores da Superliga, nomeadamente Florentino Pérez, presidente do Real Madrid, e a UEFA. Aleksander Ceferin, líder da UEFA, chegou a comparar a Superliga com o “Capuchinho Vermelho”, um " lobo disfarçado de avó, pronto para te comer”, mas o esloveno tem agora uma clara derrota judicial.

Florentino já reagiu ao que o TJUE determinou. O presidente dos blancos manifestou “enorme satisfação” pelo veredicto, deixando “duas conclusões”: “O futebol europeu de clubes não é, nem jamais será, um monopólio. E, a partir de hoje, os clubes são os donos do seu destino, tendo o o direito de propor e impulsionar competições europeias que modernizem o futebol”, disse Pérez.

O Barcelona, por seu lado, também expressou “satisfação” com o desfecho, reiterando que “apoia o projeto” da A22 Sports. “Abre-se um caminho para uma nova competição de máximo nível na Europa”, indicam os culés.

Esta sentença inaugura, de facto, um mundo de possibilidades. A UEFA deixa de poder ameaçar clubes e jogadores com sanções, enquanto a Superliga poderá explorar novos formatos, independentes do quadro já existente.

Ao longo dos últimos meses, os responsáveis da Superliga deixaram várias garantias sobre o eventual desenho da prova. Asseguraram — também em conversa com a Tribuna Expresso — que o formato será fruto do “consenso” entre os clubes, sem imposições, e que se abandonará a ideia de membros permanentes, sendo um campeonato “aberto”, com “subidas e descidas”.