Surf

Carissa Moore, a campeã está aqui

É a três vezes campeã mundial de surf (2011, 2013 e 2015) que era suposto, mas não aparece para responder às nossas perguntas. É Carissa Moore, a havaiana que nos responde mais tarde, por e-mail. Aos 24 anos está uma vez mais na luta pelo títulos em Cascais, onde já venceu por duas vezes

Cameron Spencer

Há uns anos, Carissa Moore fartou-se de ler e ouvir o mesmo. Estava a caminha de ser campeã do mundo, melhor do que toda a gente, a mais nova de sempre a sê-lo. Já remava para apanhar a onda que, dali a tempos, apenas ela conseguia apanhar. Não se preocupava com o que comia, vivia como queria, feliz da vida, contente por ganhar como era e não como os outros queria que ela fosse. Até ao dia em que o pai lhe perguntou há quanto tempo não se colocava em cima de uma balança. Enfiava na cabeça de uma campeã a preocupação que nunca tivera.

Parecia que todos, menos Carissa, lhe inventavam peso a mais e o esculpiam como o problema num corpo capaz de um surf poderoso, de manobras fortes, que desenhava leques de água como obras de arte. A havaiana, então com 20 e poucos anos, tornou-se insegura, temerosa da maneira como os outros a viam, preocupada com a comida. Chegou a querer vomitar o que ingeria. A ser alvo de trolls de internet que centraram as miras na surfista. Não percebia porque não aparecia nas capas de revistas, destapada por biquínis curtos e com muita pele à mostra. “O meu pai foi o primeiro a reparar. Claro que ele diz as coisas para o meu bem, mas ganhei uma tendência de ouvir apenas a parte negativa, e pensar que ele não estava satisfeito”, escreveu, na altura, no seu blog.

O tempo curou-a. Focou-se “nas coisas incríveis” que o corpo fazia, portanto, pensou na magia que acontecia na relação a três entre Carissa Moore, uma prancha e uma onda. Ignorou os comentários que recebia nas redes sociais, exorcizou os pensamentos de todos os que acham que o surf feminino implicar olhar só para mulheres com pouca roupa e curvas no sítio. E foi surfando, muito e bem, ao ponto de ser a atual campeã mundial e já ter três títulos guardados lá em casa (2011, 2013, e 2015), no Havai. Aparecer, ou não, nas listas das surfistas mais sexys deixou de ser algo que lhe morava na cabeça. Passou a ser contra o que já classificou como “sexualização do surf” feminino.

Ou não. A única pergunta que não nos responde, por e-mail, é a que toca nesse tema. Combinamos falar com Carissa Moore na conferência que apresenta o Cascais Women’s Pro, mas a havaiana, que é terceira do ranking, não aparece. Não quis deixar de passar tempo dentro de água, no mar, onde se tem dado bem e já garantiu a presença nos quartos-de-final da etapa portuguesa do circuito mundial de surf. Deveria estar com o pai, a presença que lhe faz sombra em todas as provas.

Li há tempos que achas que a perna europeia do circuito (etapas de França e Portugal) são uma armadilha para a vossa forma física. Tens uma relação de amor-ódio com a nossa comida? A comida europeia não me estraga a dieta ou a minha preparação. A comida é diferente, mas gosto muito. Especialmente os gelados e os croissants!! A comida portuguesa é deliciosa [yummy, é a expressão que Carissa escolhe]! Adoro a comida do mar, é deliciosa!

E das ondas, gostas? Já venceste a etapa portuguesa por duas vezes. Aqui, as ondas são desafiantes e, por vezes, imprevisíveis. Mas estou a tentar ao máximo percebê-las e adaptar-me às condições.

Já foste três vezes campeã mundial. O que fazes para continuares motivada e na luta pelo título? Há sempre margem para melhorarmos, sempre. Estou a canalizar muita energia para melhorar a minha estratégia e prestação. E viajar à volta do mundo inspira-me sempre a tentar ser melhor do que sou agora.

Estás de novo lá em cima, nas três primeiras, a lutar até ao fim. Vocês continuam a dar-se bem, mesmo estando constantemente a “brigar” por vitórias? Bom, atualmente estou em terceiro no ranking e praticamente fora da corrida. O ano passado fui até ao fim com a Courtney [Conlogue]. E adoro a Tyler [Wright]! Ela é uma pessoa incrível, tanto fora como dentro de água. Somos uma família no tour!

O teu pai acompanha-te em quase todas as etapas. Imaginas-te a competir sem o ter a apoiar-te, na praia? Sim, o meu pai está comigo em quase todas as provas. É fantástico tê-lo ao meu lado. É o meu treinador e um dos meus melhores amigos. A sua presença conforta-me quando estou muito longe de casa.

Achas que algum dia veremos as mulheres e competirem contra os homens? Hum, não sei. É ótimo ter este evento a acontecer ao mesmo tempo que o dos homens [o Cascais Women’s Pro coincide com Billabong Pro Cascais, prova masculina do circuito de qualificação]. Adoro estar perto da energia deles, é inspirador.