Tribuna 12:45

Sporting e a volta ao mundo dos estados emocionais em 49 dias

Gualter Fatia

A época festiva em que nos encontramos propõe alguma acalmia. Se passou um Natal tranquilo, considere-se um privilegiado por não lhe terem servido na noite da consoada assuntos laborais no prato. O mesmo não pode dizer quem dirige o Sporting.

As decisões urgentes não filtram propriamente as alturas que escolhem para serem tomadas. Foram dias intensos no ecossistema leonino. Talvez ainda não estivesse esgotado o exagero de comida preparado para a festividade e o clube de Alvalade anunciava a saída de João Pereira. A oficialização no esfumar do dia 25 de dezembro denotava que Frederico Varandas, por escolha própria, sob a inspiração sempre proporcionada pelos doces sazonais, se decidira por um novo rumo.

Nas primeiras horas da manhã seguinte, Rui Borges estava a ser apresentado como curandeiro e cumulativamente novo treinador do Sporting. Entre o último jogo de Ruben Amorim, o fogacho existencial do líder João Pereira e a estreia de Rui Borges no banco de suplentes, os leões atravessaram 49 dias de degustação de sensações várias. Agora, completaram uma volta de 360 graus regularizando o pagamento do pacote de êxtase cuja subscrição não tiveram capacidade de pagar durante o último mês e meio.

Com um rentável aproveitamento do tempo, é possível congregar nesse período visitas a vários pontos do mundo dos estados emocionais. O Sporting passou por uma fase de desnorte que temporariamente custou a liderança do campeonato. Evidente era, por muito que Frederico Varandas tenha demorado a admiti-lo publicamente, que a afinação não esteve perfeita e quiçá o maestro João Pereira pudesse ser responsável pelo desleixo, evidenciando um erro de casting do próprio presidente confiante de que estava a criar um clone de Ruben Amorim.

Firme na intenção de ser Rui Borges desde o primeiro dia, o novo treinador parece ter invertido o momento ao recuperar a liderança do campeonato. 2025 está aí para ser desempacotado. Nesta altura, muitos falam com a boca cheia de passas às quais inculcam desejos para um ano melhor. Deverá o Sporting também agarrar-se à confiança depositada nos frutos secos para não ter uma recaída e manter-se no rumo certo.

O lema “quando faltar inspiração, que não falte atitude” parece ter sido um sucesso comunicacional. Rui Borges mostrou-se cuidadoso com a primeira imagem que deixou. Quis cativar e fê-lo. O dérbi foi um prolongamento da tentativa de sedução aos adeptos a passarem por uma fase de desencanto. Por isso, contra o Benfica, ganhou duplamente: confirmou ser capaz de semear perseverança e, ao mesmo tempo, provou que o Sporting não tem que viver eternamente ligado a uma ideia de jogo.

Rui Borges moldou o Sporting ao seu gosto numa rutura com o passado indiferente aos métodos com que os leões conquistaram o campeonato. Existiam riscos inerentes à opção até porque muitos chegaram a acreditar que bastava carregar no acelerador, sem fazer desvios nas irregularidades da estrada, e a máquina montada por Ruben Amorim atingiria um novo título. Foi um equívoco.

Ainda assim, o cenário não passou a ser maravilhoso para o Sporting que voltou ao primeiro lugar, mas sem a folga que já chegou a ter. Em igualdade com o FC Porto e a apenas dois pontos de distância do Benfica, há uma tríade de legítimos interessados ao posto mais alto da classificação. No caso dos leões, segue-se uma visita a Guimarães, cidade que Rui Borges deixou para rumar à capital. Um bom teste à ideia de que um feitiço pode atingir quem o criou.

O que se passou

O Sporting recuperou a liderança do campeonato ao ganhar ao Benfica (1-0). O FC Porto dominou o dérbi da Invicta e derrotou o Boavista por 4-0 no grito do Ipiranga de Rodrigo Mora

Primeiro, Frederico Varandas falou do “presente envenenado” que deu a João Pereira. Depois, despediu o treinador que o presidente do Sporting andou a tentar que fosse um clone de Ruben Amorim. Por fim, Rui Borges foi apresentado

Paulo Fonseca deixou o AC Milan e prepara-se para ser substituído por Sérgio Conceição

Celebrou-se mais um Natal e com ele o boxing day

Parecia impossível, mas o Manchester City voltou mesmo a ganhar um jogo de futebol

O Sp. Braga conquistou a Supertaça de futsal derrotando o Sporting (2-1)

Zona mista

Não tive um ano mau em todos os clubes por onde passei. Tenho a felicidade de estar sempre no clube certo à hora certa

O virtuoso desempenho do Nottingham Forest esta época não estava propriamente nas contas. A equipa de Jota Silva alcançou a quinta vitória seguida na Premier League, a terceira consecutiva sem sofrer golos, e é vice-líder à condição do campeonato inglês. Nesta newsletter já antes tínhamos contado a história do internacional português. Desta vez, em entrevista à Tribuna Expresso, contou-a ele próprio. Nos jogos do clube bicampeão europeu treinado por Nuno Espírito Santo recebe agora os amigos, antigos escudeiros dos não assim tão longínquos tempos em que estava na distrital do Porto.

O que vem aí

Segunda-feira, 30
Ruben Amorim tenta voltar às vitórias no Manchester United-Newcastle (20h, DAZN1)

Terça-feira, 31
🏀 Na NBA, há um clássico entre Golden State Warriors e Cleveland Cavaliers (3h, Sport TV1)
🏀 Em honra da portugalidade, os Boston Celtics, de Neemias Queta, e os Toronto Raptors, de Mery Andrade, defrontam-se antes de dar a música dos patinhos (20h, Sport TV1)

Quarta-feira, 1
⚽ Feliz Ano Novo a ver o Championship na Sport TV1: QPR-Watford (12h30); Sheffield Wednesday-Derby County (15h); Hull City-Middlesbrough (17h30); Sunderland- Sheffield United (20h)

Quinta-feira, 2
Em Glasgow, Rangers e Celtic medem forças (15h, Sport TV1)
Há uma meia-final da Supertaça de Itália entre Inter e Atalanta a ser jogada na Arábia Saudita (19h, Sport TV1)

Sexta-feira, 3
FC Porto (18, Sport TV2) e Sporting (20h15, Sport TV1) entram em campo frente ao Nacional e ao Vitória SC, respetivamente
Na outra meia-final da Supertaça de Itália, entre Juventus e AC Milan, Sérgio Conceição estreia-se no banco de suplentes dos rossoneri (19h, Sport TV3)
O Real Madrid procura, com uma vitória em Valência, assaltar a liderança da liga espanhola (20h, DAZN1)

Sábado, 4
🛼 Há um clássico no hóquei em patins com o Sporting a receber ao Oliveirense (15h, DAZN6)

Domingo, 5
Outra Supertaça emigrada: PSG e Monáco vão ao Catar decidir o troféu (16h30, Sport TV3)
O Estádio Olímpico recebe o dérbi da capital italiana entre AS Roma e Lázio (19h45, Sport TV3)

Hoje deu-nos para isto

Já num destes dias em que as agendas anuais escasseiam em folhas com possibilidade de serem rabiscadas, os jornalistas que fazem a sua Tribuna Expresso estavam empenhados em receber a condescendência de um raio de sol que acompanhasse o bebericar do café depois do almoço. Para efeitos de transparência para com o caro leitor, fique sabendo que é nestes congressos em torno da vitamina D que surgem muitas ideias transformadas nos textos que levamos até si.

A caminho daquele último trago especialmente amargo, o Pedro Barata sai-se com o desafio de imaginarmos um top-5 de figuras desportivas de 2024 a nível nacional. Colocando os neurónios a levantar halteres, fomos debatendo méritos alheios que poderiam levar um punhado de pessoas a acederem à nossa classificação.

Em ano de Jogos Olímpicos, considerámos os medalhados – Iúri Leitão, Rui Oliveira, Patrícia Sampaio e Pedro Pichardo – e outros nomes que não tendo certificado metálico dos gloriosos feitos em nada saem subjugados, como Filipa Martins ou Gabriel Albuquerque. Pensámos também na época sobre rodas de João Almeida, no quão perto se colocou Nuno Borges de ser considerado o melhor tenista português de sempre ou na história que Neemias Queta está a escrever na NBA.

Mais tempo estivéssemos a raciocinar e outras opções acabariam por surgir. Caso o exercício mostrasse intenções maiores do que o mero entretenimento e seria difícil encontrar um ranking que pudesse ser divulgado com a concordância de todos os que para o seu debate contribuíram. É assim a vida: as ideias descartadas fortalecem aquela que acaba por prevalecer mesmo que nada de visível exista delas no produto final.

Ruben Amorim acabou por ser o líder inequívoco de todas as propostas. Simultaneamente, num tipo de eleição mais séria, impressa nas folhas do nosso semanário, o treinador do Manchester United foi escolhido pela redação do Expresso como figura do ano. Não lhe faltou obviamente concorrência de peso com origem em várias áreas, sobretudo da política.

Ora, é de facto incomum que profissionais do futebol sejam cogitados para este tipo de nomeações. Talvez Ruben Amorim não seja só um profissional do futebol, simplesmente emprestou as suas múltiplas valências ao desporto (explicamos mais sobre esta figura holística aqui). Especialistas em marketing consideram-no sedutor. Especialistas em relações internacionais olham para ele como o líder moderado que contrasta com a ascensão do autoritarismo na política. Especialistas em filosofia elogiam-lhe a humanidade. Foi para quem reduz Ruben Amorim a vencedor de um campeonato que se criou a metáfora da ponta do icebergue.

Por vezes, fica difícil ter perceção do desafio que o técnico assumiu desde que deixou o Sporting. Não indo mais longe, apenas entre Twitter e Instagram, o Manchester United coleciona mais de 100 milhões de seguidores, ou seja, um número bem acima da população de Portugal e altamente superior ao número de votantes das últimas eleições legislativas. É um alcance impossível de rejeitar que, no caso de Amorim, leva à repercussão das suas abrangentes qualidades, pessoais e intransmissíveis, a uma escala megalómana. Além disso, se perguntarmos a pessoas na rua qual o clube de futebol que apoiam vai-lhes sair uma resposta, consolidada ou inventada no momento. Se as questionarmos sobre o partido político com o qual mais se identificam, provavelmente não se vão pronunciar.

Quer isto dizer que o labor legislativo é menos importante do que os domingos de bola? Claramente que não. No entanto, há fenómenos especiais, como o de Ruben Amorim, com lugar reservado na galeria dos ilustres da sociedade e igual direito a reconhecimentos como o que a redação do Expresso lhe deu.

Gualter Fatia

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