Dortmund tem sido um território de passagem de versões ainda por chocar de jogadores que preenchem os requisitos impostos pelo controlo de qualidade dos gigantes europeus. Nos tempos mais recentes, o Real Madrid levou Jude Bellingham para a incubadora e o Manchester City fez Erling Haaland sair da casca. No fundo, custa menos transferir jogadores para outros clubes do que vender a alma ao diabo como aconteceu no passado.
Ganhar a Liga dos Campeões em 1997 acabaria por abrir um precedente perigoso. Na final jogada em Munique, o Borussia Dortmund, onde alinhava Paulo Sousa, não desperdiçou o bis de Karl-Heinz Riedle para bater a Juventus (3-1) e angariar o par de orelhas embutidas em metal mais desejado do futebol. O problema foi o que veio depois.
Insaciável, o clube alemão foi em busca de mais glórias equiparáveis àquela, arriscando investimentos milionários com fé de que outras campanhas europeias de sucesso devolvessem o montante gasto. Não aconteceu. Falhar o acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões em 2003/04 e 2004/05 foi um rombo suficiente grande para que o clube tenha estado à beira da bancarrota.
A dívida de 200 milhões de euros quase derreteu o clube fundido do carvão e do aço. Diante do abismo, o incentivo para dar um passo atrás chegou com um empréstimo de €2 milhões concedido pelo condoído rival Bayern Munique. Foi apenas um grão de areia para tentar fazer uma praia, mas ficou o indício de desespero.
Nas dificuldades financeiras, que não trouxeram consequências ao nível de uma descida de divisão, moldou-se a filosofia que o Dortmund ainda hoje profetiza e que levou à recuperação económica do clube: fazer dos jovens uns protagonistas precoces, com tudo que isso tem de bom e de mau.
Jürgen Klopp tornou-se treinador do Dortmund em 2008 e reergueu a equipa ao ponto de vencer a Bundesliga duas vezes (2011 e 2012) e levar o clube a nova final da Liga dos Campeões (2013). É certo que não a ganhou. Em Wembley, o Bayern Munique, o tal clube que deu um pequeno impulso para que o Dortmund se reerguesse, ganhou com um golo de Arjen Robben em cima dos 90 minutos.
Desde que Jürgen Klopp começou a treinar o Dortmund (saiu em 2015 para o Liverpool), o quinto lugar da equipa na edição 2023/24 da Bundesliga representa uma das piores campanhas do clube, o que não deixava antever que as competições europeias fossem madeixa de sucesso. Onze anos depois o clube alemão está de regresso à final da Liga dos Campeões que se vai jogar de novo em Wembley, podendo o adversário, mediante o desfecho da meia-final entre o Bayern Munique e o Real Madrid, ser outra vez o emblema bávaro.
“É surreal”, descreveu, à falta de um discurso menos emocionado, Edin Terzić, o atual treinador do Dortmund. O conjunto amarelo e negro bateu o Paris Saint-Germain nas meias-finais. Após uma vitória no Signal Iduna Park por 1-0, o resultado repetiu-se no Parque dos Príncipes. Ao longo da eliminatória, os franceses enviaram seis bolas aos ferros. “Se tivéssemos jogado este jogo 10 vezes, talvez não o tivéssemos vencido 10 vezes”, confessou o técnico com nacionalidade alemã e croata. “São os pequenos detalhes que fazem a diferença e que caíram para o nosso lado.”
As redes sociais ressuscitaram uma fotografia em que Edin Terzić está na bancada, enquanto adepto, a ver o Dortmund sagrar-se campeão em 2012. Do lugar outrora seu e do restante estádio veio o apoio que empurrou a equipa para uma nova final europeia.
As 25.000 almas que fazem da Muralha Amarela o coração do Signal Iduna Park estão habituadas a fazerem ídolos, embora nos últimos tempos qualquer forma de apego a um jogador possa acabar em desilusão, tal o carrossel de futebolistas que por ali passam. No entanto, há um que por lá tem andado ao longo dos últimos 12 anos.
Marco Reus é o nome mais icónico da história recente do clube. O atacante e Mats Hummels são os únicos dois jogadores que estiveram na final da Liga dos Campões em 2013 e que vão repetir a presença em 2024, com a diferença de que Reus nunca saiu do Dortmund, ao contrário do defesa central que esteve três anos no Bayern Munique. No banco de suplentes, encontram-se Nuri Şahin e Sven Bender, antigos jogadores que agora fazem parte da equipa técnica de Edin Terzić.
Foi recebida com emoção a notícia de que Marco Reus não vai renovar contrato e prepara-se para deixar o clube no final da época. Por um bom motivo, a despedida não será feita no Signal Iduna Park, mas em Wembley. Quando ficou confirmado que seria o Dortmund a jogar a final da Liga dos Campeões, Reus usurpou o megafone dos adeptos que tinham viajado até ao Parque dos Príncipes e mostrou que, mesmo de chuteiras nos pés, é um deles. Menos seguros das letras dos cânticos, acompanharam-no os restantes colegas. Em Wembley, juntos, vão tentar repetir os festejos.