Este Sporting é uma espécie de festival de acrobacias aéreas. Às vezes os aviões seguem lado a lado, velozes, absolutamente coordenados nas habilidades, imparáveis e desafiando a gravidade;, outros que depois de juntos se separam, cada um para cada lado, de surpresa, confundindo quem em terra, de queixada levantada, tenta acompanhar o ritmo daquelas setas divergentes. E depois também há o piloto estrela, que sozinho tenta as piruetas mais imaginativas.
No Estádio do Algarve, casa emprestada do Farense, houve um pouco de tudo isto. Gyökeres marcou três golos, em situações normais estaríamos aqui a tecer loas loquazes ao tanque sueco, que nos últimos segundos de jogo ainda cavalgava esfomeado à procura de mais um golo, mas o coletivo leonino foi de tal forma arrasador que o nórdico às tantas parece apenas uma bela peça de uma engrenagem afinadíssima, oleadíssima, procurando a terraplanagem adversária.
A reação à perda foi, durante todo o jogo (bem, talvez um pouco menos no início da 2.ª parte), mais imediata que um cão-pisteiro. O posicionamento dos centrais permitiu que muitas bolas dali saíssem para a zona de perigo. Trincão fez uma 1.ª parte luxuriante, com a leveza de quem tem algodão-doce nas botas. E Morita, a cola que tudo ligou, fosse a defender, fosse a lançar colegas, a colocar os passes essenciais, no tempo certo. Foram cinco golos e ninguém se chocaria se mais fossem, tal a avalanche que pareceu acompanhar as ondas do padrão das cadeiras do estádio algarvio, bem composto de veraneantes e outros.
Ao contrário do que fez, por exemplo, o Rio Ave na 1.ª jornada, o Farense mostrou cedo que a ideia seria conter a equipa do Sporting. Deu a bola ao adversário e comprimiu linhas, evitou a pressão e apostou na consistência defensiva. No ataque, não tinha nada que saber: de Ricardo Velho, a bola ia diretamente para a frente.
A primeira meia-hora do Sporting é um festival de futebol de ataque, de variabilidade, de demonstração de soluções, as mais variadas. A equipa de Rúben Amorim ia embatendo na Grande Muralha de Faro que José Mota montou e quando esta deixava uma nesga para entrar, estava lá Ricardo Velho, mas impressionava pela dinâmica: se pelo meio não dava, estavam ali os alas, se o ataque posicional não fazia sentido, tomem lá estas quebras de linhas.
O primeiro golo do Sporting, apesar do volume de ataque, apareceria então uns minutos antes dos 30’. A cavalgada de Quenda, da direita para dentro, atraiu um ror de marcações, com o jovem português a deixar para Pote, que picou para a entrada na área de Bragança. Ricardo Velho ainda defendeu o primeiro remate, mas Gyökeres estava lá para a recarga. De uma iniciativa individual, o Sporting construía um lance coletivo que finalmente quebrava a estóica defesa do Farense.
O sueco marcaria de novo ainda na 1.ª parte num pontapé de penálti e após o intervalo o Sporting tentou dar a iniciativa ao adversário, com o jogo a partir em demasia nos primeiros minutos. Talvez Rúben Amorim estivesse a preparar um cruel caldinho para onde enfiar os jogadores do Farense. Aos 66’, e já com o metro quadrado a estar bem menos povoado na metade defensiva do Farense, Inácio encontrou Gyökeres, que recebeu de costas, girou e foi por ali fora, aproveitando que Moreno, já amarelado, apenas podia defender com os olhos - coisa que com o sueco é normalmente a morte do artista. Ainda algo afastado da baliza, o avançado puxou a culatra do pé esquerdo e rematou cruzado para o hat-trick. E aí vão seis golos em três jogos na I Liga.
Minutos depois, o auto-golo de Lucas Áfrico escrevia a sentença final do Farense, então já fisicamente numa luta contra si próprio. Os últimos 20 minutos de jogo seriam novamente de intenso domínio do Sporting, com as alterações de Amorim a não mudarem a dinâmica e ainda a trazerem frescura. Como a do avião solista Marcus Edwards, perito em acrobacias a baixa altitude, e que aos 81’ passou por uma série de adversários para mais um grande momento individual de uma equipa que é, neste momento, um coletivo temível no ataque. Lá atrás, Amorim estará seguramente satisfeito que a equipa não tenha finalmente sofrido golos. Fora um lance de Belloumi logo a seguir ao primeiro golo do Sporting, pouco se viu dos algarvios e Kovacevic teve uma noite descansada. O Sporting, além de Gyökeres, conseguiu ter tudo o resto.